Não faço ideia de quem escreveu a parábola de "O Velho, o Rapaz e o Burro". Sei apenas que ela irá permanecer actual enquanto existirem no mundo pessoas de idade, jovens e animais.
Pensei nela numa conversa que tive recentemente com alguém, mais jovem que eu, que queria saber o que tinham sido as "Tertúlias da SCALA no Dragão".
Fiz uma pequena síntese histórica onde tive obrigatoriamente de falar no seu ideólogo, Fernando Barão, sem me retirar do retrato (fui eu que continuei o seu legado durante vários anos...). Mas o que este rapaz quis saber era quais eram os nossos objectivos, e se eles tinham sido conseguidos, ao longo de mais de onze anos, em que realizámos tertúlias culturais no primeiro andar do café "Dragão Vermelho", por onde passaram algumas das personagens mais importantes e curiosas da Cultura Almadense (e também algumas figuras nacionais, como foram o caso de Raul Solnado ou Vasco Lourenço).
Disse-lhe que os nossos objectivos, enquanto associação cultural (a SCALA é sobretudo uma associação cultural), foram amplamente conseguidos. Destruímos alguns mitos, o maior talvez fosse a capacidade de fazer algo de importante, sem ter nenhuma ligação ao Poder Local (o único apoio que recebemos foi dos donos do "Café Dragão Vermelho", que sempre nos deram apoio e a única contrapartida que recebiam era a despesa que fazíamos, quem queria ía lá jantar, quem queria apenas assistir à "Tertúlia", podia apenas beber um café...).
Por sabermos que havia uma grande défice cultural no nosso país, achámos por bem, fazer algo de diferente, que enriquecesse as pessoas, ao mesmo tempo que lhes oferecia um convívio familiar (e durante anos sentimos-nos mesmo uma "família", os meus filhos cresceram lá, apaparicados por todos aqueles amigos...).
Claro que tivemos alguns "inimigos" de peso. O maior talvez fosse o futebol (a "Tertúlia" era mensal e realizava-se na primeira quinta-feira no mês e muitas vezes coincidia com as jornadas europeias...). Notava-se a ausência de alguns amigos quando jogava o Benfica, o Sporting ou o Porto...
Mas estou a "estender o lençol", sem dizer o que queria... Quando fui buscar "O Velho, o Rapaz e o Burro", tem muito a ver com as reacções dispares de algumas pessoas, para justificarem a sua ausência: uns não iam porque era demasiado "intelectual"; outras achavam que aquela cultura era demasiado popular; e outros ainda, achavam que deviam ser só para a SCALA e com pessoas da SCALA...
Estavam todos errados. Embora soubéssemos (eu e o Fernando, falámos várias vezes sobre o assunto...) que a cultura era uma coisa de minorias, queríamos chegar ao maior número de pessoas, sem qualquer tipo de prurido social ou cultural.
E foi muito bom, enquanto durou... Como tudo na vida, teve o seu tempo. Mas foi uma boa "pedrada no charco" na cultura de Almada.
Nota: texto publicado inicialmente no "Casario do Ginjal".
(Fotografia de Gena de Souza - Almada)
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